REFLEXÃO
Por Publio José, jornalista
FALSA PIEDADE
Começou o festival de falsa piedade que todo ano, nesse
período, infesta nossas caixas de correio e ocupa preciosos espaços da mídia.
Refiro-me a essa onda que ocorre no período natalino de se fazer caridade a
favelados, desvalidos, desempregados, aos mais necessitados, enfim, através da
distribuição de roupas, alimentos, brinquedos, remédios e outras coisas mais.
Alguém, aí no seu canto, poderá indagar “mas não é essa a essência do espírito
natalino?” Não, não é.
O espírito natalino é muito mais profundo e muito mais
duradouro. Aliás, quem restringiu, quem convencionou adotar essa postura de
voltar-se ao próximo com mais intensidade somente nesse tempo foi o homem. Pois
isso, com certeza, não é coisa de Deus. Ao contrário, aproveitar-se de um
momento, de uma época, para praticar solidariedade a necessitados é a mais pura
demonstração de falsa piedade.
Ou será que a ausência de suprimentos, de empregos, de
roupas, de dignidade, enfim, só ocorre no período natalino? E o restante do ano
como fica? Isso tudo é uma hipocrisia generalizada, uma onda de falsa piedade
que acomete principalmente a classe média nessa época. É como se todos
quisessem se livrar, na virada do ano, dos remorsos, das crises de consciência,
ocasionadas pelo que deixou de fazer em benefício do próximo ao longo do ano.
Miséria, fome, ausência de suprimento ocorre o tempo todo. Além do mais, o tal
“espírito natalino” serve, sob medida, para esconder o principal culpado disso
tudo: o governo federal. Que incentiva essas campanhas para, com isso,
acobertar sua omissão, sua falta de planejamento sério, maduro, em relação às
carências dos mais humildes. Aproveitando-se, inclusive, da boa vontade dos
ingênuos, dos desavisados, daqueles que agem no emocional.
Pois a falsa piedade opera, principalmente, na falta de
conhecimento e se concretiza nas pessoas, por excelência, no campo emocional.
Aí, quando chega o período natalino, a um estalar de dedos da mídia,
impulsivamente, todo mundo corre a tentar alegrar a vida dos que não têm nada
para comemorar, integrando essa corrente demagógica, hipócrita, carregada de
dissimulação que todos estamos acostumados a ver.
Com isso, não quero dizer que
seja maléfico, prejudicial ou anticristão fazer caridade no Natal. E que não
tenha gente de boa vontade envolvida nessas campanhas. Tem. Tem, sim, gente bem
intencionada na parada. Mas tem também aqueles que agem mais em função dos
holofotes do que das carências reais e autênticas dos necessitados.
A esses é
hora de perguntar: a caridade feita agora tem o mesmo ímpeto, a mesma ênfase
durante os meses de janeiro, fevereiro, março, abril?
O espírito cristão, traduzido em amor e respeito ao
próximo, é coisa muito séria, pois é matéria prima gestada no coração de Deus.
Não é à toa que o próprio Jesus classificou como o segundo maior mandamento “o
amar ao próximo como a ti mesmo”. O primeiro, logicamente, é amar a Deus sobre
todas as coisas, embora os dois preceitos estejam tão interligados e
intrinsecamente tão associados um ao outro, que um não subsiste sem o outro – e
vice-versa.
Porque é impossível amar-se a Deus sem amar ao próximo. Como,
igualmente, é impossível amar ao próximo sem amar a Deus. Assim, faça caridade
nesse Natal – também. Distribua alimentos, roupas, amor, atenção, sabendo que
estará, com isso, alegrando, em muito, o coração de Deus (se essas ações forem
também repetidas em janeiro, fevereiro, março...). Aí, sim, estará sendo
praticado o verdadeiro espírito cristão. Certo?
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