Eu sempre dediquei uma atenção muito especial ao
vocábulo `saudade`, até pelo fato do mesmo só existir na língua portuguesa. Não
que este sentimento não possa ser sentido por outras pessoas de nacionalidades
diferentes. Em verdade, até hoje, não compreendo bem o seu significado, uma vez
que é cantado em prosa e verso que a saudade é provocada pela ausência de algo
e em especial de alguém que se foi.
Ora, como posso sentir saudade de alguém que
conseguiu partir? Como posso sentir saudade de alguém que se foi sem deixar
nada em mim? Como posso sentir saudade de pessoas que partem tão
verdadeiramente que não conseguem deixar sequer lembranças? Não, a saudade que
sentimos não provém da ausência de alguém em nossas vidas.
Ao contrário do que a maioria pensa, a saudade
provém justamente da incapacidade de algumas pessoas se ausentarem de nossas
vidas. A saudade nada mais é do que a presença constante de alguém que não
conseguiu partir ou, quem sabe, a saudade seja a presença de alguém que nós não
permitimos que se fossem verdadeiramente.
Pois é, meu velho, todos nós sentimos saudade,
porque todos nós precisamos nos ver em outras pessoas, principalmente naquilo
que mais admiramos em nós mesmos. Na verdade a saudade que sentimos de algo ou
de alguém, nada mais é do que a saudade que sentimos de nós próprios, do que
existe de iluminado dentro de nós. A saudade serve como forma de afirmação
daquilo que somos e que só conseguimos ser no outro.
Como afirmou Todorov o eu é produto dos outros
que, por sua vez, ele produz. De tal forma que a anulação, o distanciamento do
outro significa, no mínimo, o enfraquecimento do “eu”. Daí a saudade que
sentimos do outro nada mais ser do que a saudade que sentimos de nós próprios.
Na verdade, somos prisioneiros do EU exterior
porque não conseguimos viver plenamente o EU interior. Daí a saudade que
sentimos dos outros nada mais ser do que a afirmação do Eu interior que
projetamos nas coisas e nas pessoas das quais imaginamos ter saudade.
Prof. Iran Padilha (artigo publicado no Jornal
de Hoje)
Nenhum comentário:
Postar um comentário