A Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) terá de
devolver a uma ex-fiel mais de R$ 74 mil, em valores de 2004 a serem
corrigidos. A igreja não conseguiu fazer com que seu caso fosse reavaliado pelo
Superior Tribunal de Justiça (STJ), que manteve a decisão do Tribunal de
Justiça do Distrito Federal (TJ/DF).
Segundo nota que foi divulgada pela assessoria de
imprensa do Superior Tribunal de Justiça, a fiel trabalhava como contadora. Em
2003, recebeu uma grande quantia em pagamento de um trabalho. Um pastor da IURD
a teria então pressionado para que fizesse um sacrifício “em favor de Deus”. A
insistência do pastor incluía ligações e visitas à sua residência.
Segundo alegou, estava em processo de separação judicial,
atordoada e frágil. Diante da pressão, teria feito a doação de mais de R$ 74
mil, em duas parcelas. Depois disso, o pastor teria sumido da igreja, sem dar
satisfações. A IURD afirmava não saber do ocorrido nem ter como ajudá-la. Em
2010, a contadora ingressou com ação para declarar nula a doação.
Ela alegou que, após a doação, passou a sofrer de
depressão, perdeu o emprego e ficou em crescente miséria. Testemunhas apontaram
que chegou a passar fome, por falta de dinheiro.
ATO DE FÉ
Para a IURD, atos de doação como esse estão apoiados na
liturgia da igreja, baseada em tradição bíblica. Ainda conforme a nota que foi
publicada pelo STJ, através da sua defesa, a igreja disse que a Bíblia prevê
oferendas a Deus, em inúmeras passagens.A defesa da IURD destacou a história da viúva pobre, em
que a Bíblia afirmaria ser muito mais significativo o ato de fé de quem faz uma
doação tirando do próprio sustento.
Assim, a doação da contadora não poderia ser desvinculada
do contexto religioso. A IURD apontou ainda a impossibilidade de interferência
estatal na liberdade de crença, sustentando que o estado não poderia criar
embaraços ao culto religioso. Além disso, a fiel teria capacidade de reflexão e
discernimento suficiente para avaliar as vantagens de frequentar a igreja e
fazer doações.
SUBSISTÊNCIA
Para o TJDF, as doações comprometeram o sustento da
ex-fiel. Entenderam os desembargadores do DF que o ato violava o artigo 548 do
Código Civil, que afirma ser nula a doação de todos os bens sem reserva de
parte ou de renda suficiente para a subsistência do doador.
Sob essa perspectiva, as testemunhas apontaram que o
padrão de vida da contadora foi progressivamente reduzido diante das campanhas
de doação. A insistência do pastor teria impedido que ela realizasse seus
planos de investimento do dinheiro recebido, entre eles a aquisição de um
imóvel.
Além disso, o TJDF entendeu que, sendo profissional
autônoma, ela não poderia contar com remuneração regular, e o valor doado
constituiria reserva capaz de ser consumida ao longo de anos na sua manutenção.
O tribunal observou ainda que “todo o quadro de ruína
econômica em que se inseriu abalou seu estado de ânimo, havendo, ao que consta,
até mesmo sido afetada por depressão, que mais ainda dificultou a reconstrução
de sua vida”.
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