O amor por um time de futebol pode levar a diversas façanhas.
Não perder – por hipótese nenhuma – os jogos do time do coração, fazer longas
viagens para prestigiar as partidas fora de casa, não ter mais onde guardar a
extensa coleção de camisas, canecas, escudos e outras lembranças, são apenas
alguns dos exemplos de torcedores apaixonados por seus clubes do coração.
Mas imagine tornar o próprio filho um sócio-torcedor
ainda na barriga da mãe? A ideia inusitada partiu do abcedista Daniel Gouveia,
de 30 anos, que ao descobrir que seria pai não hesitou em fazer a adesão do
bebê e com direito à foto. Mas para entender a atitude, no mínimo, inusitada, é
importante conhecer a história de amor entre Daniel e o ABC.
Desde cedo, Daniel torcia por um time de fora do Estado,
prática comum entre os natalenses, já que os clubes da casa não tinham estádio
próprio e era normal optar por times maiores. A partir de 12 anos, ele conta
que os tios começaram a levá-lo para jogos do ABC, América e Alecrim, mas foi a
primeira ida a um jogo do ABC no Machadão que foi o pontapé para o início de
uma relação cercada por momentos marcantes. “Senti um arrepio e muita emoção.
Foi ali o começo de tudo e agora estava com duas paixões: o São Paulo e o ABC”.
Daniel virou o tipo de torcedor que faz questão de
assistir a todos os jogos, como programação favorita. Mas foi em 2006, na
inauguração do estádio do ABC, o Maria Lamas Farache, o Frasqueirão, que o amor
pelo time foi colocado em prática. “Os torcedores fizeram uma campanha para
ajudar na construção do estádio e na época ajudei na compra de cimento e
adquiri uns quatro sacos. Para mim, que era estagiário, era muito dinheiro, mas
sempre busquei a valorização do time potiguar. Em Recife, por exemplo, é uma
tradição torcer pelo time da casa e, infelizmente, o que vemos em Natal é o
chamado Complexo de Vira-Lata”, disse.
Ainda segundo o abcedista, também em 2006, ele foi fazer
um intercâmbio no Canadá por um período de seis meses. E foi lá, numa terra
distante, que mais uma vez ele resolveu dar provas da paixão pelo time do
coração. “Bati uma foto tirando a neve e apenas com a camisa do ABC, só que a
menos dez graus centígrados. Depois postei na página do clube. No Canadá andava
quase todos os dias com a camisa do ABC e as pessoas me paravam, perguntavam
sobre o time e eu sentia o maior orgulho”, revelou.
Já de volta a Natal, Daniel decidiu que gostaria de
ajudar mais o time do coração e resolveu virar sócio-torcedor, fazendo parte do
primeiro programa de sócio lançado pelo clube. “Comecei a mudar a cabeça dos
meus amigos e incentivar a ida deles para o estádio, para que eles pudessem ver
um time potiguar, não importando qual fosse. A proposta foi surtindo efeito e
vi que deveria continuar buscando a valorização dos times da casa”.
Como todo torcedor dedicado, Daniel conta que nunca mediu
esforços para acompanhar os jogos do seu time. A sua primeira viagem foi para
Campina Grande, onde assistiu ABC x Central de Caruaru, pela série C. “Segui um
comboio de ônibus e neste jogo tinha mais gente do ABC que as pessoas e a
torcida do local. Outro jogo marcante foi o final da série C, em 2010, no
Frasqueirão. O jogo foi no domingo bem cedo e fui virado de uma festa, porque
não podia perder”.
AMOR EM PRETO E BRANCO
A história de amor entre o casal Daniel Gouveia e Rayanne
Isabelly, hoje, esposa, surgiu em pleno carnaval de Caicó, no interior do Rio
Grande do Norte. Após duas semanas de namoro, o abecedista não hesitou em levar
a então namorada para um jogo do ABC, no Frasqueirão, e o resultado foi bem
melhor do que esperado. Daniel conquistou o seu grande amor e de quebra, o ABC
ganhou uma torcedora fiel. “O ABC ganhou o jogo contra o América e ela adorou
“.
Rayanne explica que teve receio de ir ao estádio no
início, por temer brigas de torcedores, mas a experiência foi muito positiva.
“Desde o começo do namoro ia para o estádio e quando Daniel ia sozinho eu
achava ruim”, disse.
A relação do casal e a paixão pelo time continuou se
intensificando e após alguns anos de namoro Rayanne engravidou de João Mathias,
nascido na última semana. De acordo com Daniel, passada a emoção da descoberta
da gravidez da esposa, no final do ano passado ele chegou para Rayanne e propôs
que também fosse feita a adesão do filho ainda na barriga ao plano de sócio
torcedor do ABC. “Ela gostou da ideia e aprovou na hora. Fui fazer a carteira,
perguntei se podia fazer sem foto, mas logo veio a ideia de usar a
ultrassonografia de sete meses do João. Mandei o print e foi feita a carteira”,
vibrou.
O novo integrante do Mais Querido, ainda estava a
caminho, mas foi na festa de lançamento do novo programa de sócio torcedor do
ABC, realizada no Arena das Dunas, que o assunto se tornou mais evidente. Ao
ver a carteirinha de João Mathias, o conselheiro alvinegro Wilson Cardoso e o
presidente Rogério Matinho divulgou a novidade entre os torcedores.
A mãe do pequeno alvinegro deseja que seu filho, tal como
o esposo, assista aos jogos do Mais Querido e use bastante a carteirinha de
sócio, pensada e feita com muito amor. “Meu filho vai ver todos os jogos e
vamos passar para ele a importância da valorização do time da terra. Também
quero ver o João entrando com os jogadores do ABC em campo. Vai ser um momento
de realização de um sonho”, frisou Rayanne.
PROGRAMA DE FAMÍLIA
Além de promover a valorização do futebol do Rio Grande
do Norte, outra bandeira de Daniel como torcedor é e estimular as famílias a
prestigiarem os jogos dos times locais. O abecedista também acredita que os
torcedores podem ajudar seus clubes fazendo parte de programas com o
sócio-torcedor. “Quero muito dar o exemplo de valorização do que é da terra e
tornar a ida aos estádios em programas de família. Mas acho que os clubes
poderiam oferecer mais atrativos para conquistar o público, como campanhas,
apresentações musicais. Esta questão de adesão ao sócio-torcedor também é muito
importante, independente se o seu time está bem ou mal, porque você vai ajudar
o clube, garantindo a renda e ainda economizando com os jogos. O clube fica
mais forte, o futebol mais forte e o RN mais forte”.
TORCIDA ORGANIZADA
Responsáveis por um brilho mais nos estádios devido aos
famosos gritos de guerra e uniformização dos torcedores, mas também por serem
as grandes responsáveis pela potencialização da violência no futebol, Daniel
Gouveia explica que nunca teve o interesse em fazer parte de torcidas
organizadas. Para o torcedor, não há a necessidade da existência deste tipo de
grupo. “É muito mais bonito quando todos se juntam e cantam o hino, de uma
maneira natural. Não acho interessante o que acontece porque se cria uma
torcida dentro da torcida. Sei que tem a parte boa, inclusive com campanhas de
arrecadação de alimentos, mas sempre tem uns cinco ou seis que contaminam o
grupo. Prefiro não fazer parte”, declarou.
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