O amplo gabinete na
cobertura do ‘Máscara Negra’ – apelido da sede da Polícia Federal em Brasília –
dá uma vista ‘vazada’ para o Lago Sul, no horizonte, e outra para o agitado
setor de Autarquias Sul. Condecorações à instituição espalham-se por móveis estrategicamente
distanciados para o fluxo da equipe, e o jovem ocupante do gabinete não
dispensa os trejeitos gaúchos: saúda o visitante com um ‘Tchê’ e oferece
chimarrão.
Engana-se quem considera o ambiente silencioso uma isolada ilha
no coração de Brasília. Qualquer visitante é monitorado por câmeras desde o
térreo até a antessala. É um bunker onde o diretor-geral da Polícia Federal,
delegado Leandro Daiello Coimbra, comanda uma corporação com 14 mil policiais e
mais de 2 mil delegados.
Hoje, há 146.035 investigações em andamento
na PF, número exato passado pelo próprio Daiello. Avesso a entrevistas – ‘não
existe mais o papel de Xerife’, diz o delegado que prega a importância da
coletividade – o diretor-geral abre exceção e fala à Coluna sobre uma gama de assuntos:
da interface com o FBI no combate a crimes cibernéticos e financeiros – A PF
capturou 43 foragidos internacionais só este ano – do plano de realizar
concursos anuais para as carreiras, da implantação do inquérito eletrônico em
2015, do investimento em equipamentos novos para policiais e – atentai,
corruptos e bandidos de colarinho branco, de quaisquer esferas de Poder –
Daiello revela que há ‘200 investigações especiais em andamento’. Em que área?
‘Grande parte delas no combate à corrupção’.
A Polícia Federal acaba de conquistar um certificado
internacional de qualidade pelo Instituto Nacional de Criminalística (INC).
Como isso pode facilitar o trabalho da PF?
Essa acreditação faz com que os resultados
dos exames obtidos pelos nossos laboratórios sejam reconhecidos
internacionalmente, adequando-se à tendência mundial de certificação de
laboratórios forenses. Um exemplo prático é o compartilhamento internacional de
perfis genéticos gerados pelo laboratório de DNA em casos específicos, que
poderão ser confrontados com bancos de DNA de outros países via Interpol,
expandindo a capacidade de investigação da PF.
Significa que o Sistema de Gestão da
Qualidade implementado pelos laboratórios do INC foi avaliado por uma
instituição externa, isenta e independente, que verificou o cumprimento dos
requisitos que garantem a rastreabilidade e a cadeia de custódia desde o
recebimento dos vestígios até a emissão do laudo pericial.
Também reforça a posição de vanguarda da
Polícia Federal em políticas de segurança pública no Brasil. O certificado de
acreditação na norma internacional ISO/IEC 17025:2005 foi concedido pela
ANSI-ASQ (National Accreditation Board/FQS Forensic Accreditation) aos
laboratórios da área de Perícias em Genética Forenses da Polícia Federal e do Serviço
de Perícias de Laboratórios do Instituto Nacional de Criminalística da PF, que
são os primeiros laboratórios forenses do país acreditados e os primeiros da
América Latina acreditados por um organismo internacional.
É resultado do projeto de cooperação
internacional celebrado em 2012 entre a PF e o International Criminal
Investigative Training Assistance Program (ICITAP).
Em que âmbitos se dão hoje as interfaces da PF com o FBI e a
Interpol?
Com o FBI, seguramente nas áreas de crimes cibernéticos, terrorismo
e crimes financeiros, além de constantes intercâmbios no que se refere a
treinamento e capacitação. Em relação à Interpol, a PF é a representante
brasileira nessa relevante instituição, estrategicamente importante no combate
à criminalidade transnacional pela capacidade de troca rápida de informações
entre os países membros.
Como e em que áreas a PF mais tem contribuído com outros países
em investigações?
A PF tem contribuído com a captura de foragidos internacionais
(só neste ano foram 43), levantamento de dados para instrução de investigações,
tais como patrimônio, antecedentes criminais etc., e, principalmente, como o
nosso expressivo número de prisões e apreensões de drogas. Vale também destacar
os nossos esforços no combate ao tráfico de pessoas, corrupção, pornografia
infantil e crimes ambientais.
É fato a demanda de anos da corporação, por parte de agentes e
delegados, por benefícios. Evidentemente isso causa um embate natural entre
carreiras. Como o diretor-geral controla essa situação internamente a fim de
manter a disciplina e o foco dos trabalhos?
Importante ressaltar que o Diretor-Geral deve manter sempre uma
postura de equilíbrio no que se refere às demandas das carreiras da Polícia
Federal. Recentemente, apoiamos e trabalhamos para a edição da MP que garantiu
aos agentes, escrivães e papiloscopistas a recomposição salarial e o
reconhecimento do nível superior de suas atividades.
Ao mesmo tempo, concentramos esforços para a edição da MP que dá
mais autonomia à PF, ao reconhecer a ocupação da Direção-Geral por um Delegado
Federal posicionado na classe especial e também ao prever a participação da OAB
no concurso para Delegado de Polícia Federal. Essas medidas legislativas
fortalecem ainda mais a instituição que desponta no cenário nacional como uma
das mais bem avaliadas pela sociedade brasileira.
Os agentes da PF, em especial a FENAPEF, criticam a existência e
a condução do inquérito, e também os delegados por serem, segundo a entidade,
carreira existente apenas no Brasil. Isso é fato?
Essencial observar que o Inquérito não tem por objetivo a condenação
das pessoas, mas sim, a apuração dos fatos com estrito respeito ao Devido
Processo Legal e aos Direitos e Garantias Fundamentais dos investigados. Seu
formalismo e o modo imparcial como ele é conduzido pelo Delegado de Polícia
possuem amparo na Constituição Federal e representam a certeza que não se fará
qualquer investigação fora dos rígidos controles do inquérito.
Ele também existe em outros países, com nomes diversos, onde as
investigações são formalizadas, as provas são colhidas e juntadas para permitir
o estrito cumprimento da lei. Mudar o nome não irá alterar a sua natureza.
A PF tem conseguido suprir investigações com pessoal e
equipamentos no combate a crimes financeiros ou há gargalos a serem sanados
para melhorar os trabalhos?
Sim, temos conseguido suprir essa demanda. Inclusive
recentemente foi criada uma Operação Permanente, com mobilização de policiais das
unidades regionais, com vistas a suprir justamente as necessidades de pessoal
especializado nas investigações de crimes financeiros e desvio de recursos
públicos.
Como é a atuação na fronteira hoje? Há alguma região
prioritária?
Atualmente as turmas formadas na Academia Nacional de Polícia
têm como destino inicial as unidades de fronteira, principalmente calha Norte,
e com o recente Decreto Presidencial que criou o mecanismo de abertura de
concurso sempre que houver 5% de cargos vagos a lotação de servidores nas
fronteiras poderá ser constantemente mantida e incrementada.
O que se pode esperar para concursos da corporação para os
próximos anos?
A publicação do Decreto n. 8.326/2014 pela
Presidência da República que permitiu ao Diretor-Geral a realização de concurso
sempre que houver 5% de cargos vagos, implicará na possibilidade de
planejamento do ingresso de novos servidores nos próximos anos na Polícia
Federal, bem como na perspectiva de preenchimento dos cargos atualmente vagos.
O objetivo do órgão é preencher esses cargos no menor tempo possível, porém,
sem perder a excelência na formação dos novos profissionais.
Assim, a Polícia Federal poderá realizar concursos regulares nos
próximos anos, o que refletirá numa melhor prestação de serviços à sociedade,
uma vez que tais medidas impactam na melhoria da seleção, da formação, na
distribuição de efetivo, na capacitação de servidores, no planejamento da
logística e no desenvolvimento dos servidores na respectiva carreira.
Os agentes e delegados passaram a receber ultrabooks como parte
de seus equipamentos de trabalho. O que são e como os aparelhos podem facilitar
a operação diária?
A PF tem investido continuamente na modernização de sua
estrutura de tecnologia da informação para apoio ao desempenho da atividade
policial. Para pleno usufruto desse ferramental, faz-se necessário dar-lhe
mobilidade compatível com o tipo de atuação requerida ao Policial Federal,
permitindo a ele a consulta às bases de informação, mecanismos de comunicação e
demais ferramentas de apoio mesmo quando em campo.
Além disso, a aquisição dos ultrabooks reduz o custo de suporte
e manutenção dos computadores (desktops) obsoletos, o que onera os cofres
públicos e terá os valores compensados pela redução do número de estações de
trabalho fixas posto que os ultrabooks possuirão estações de ancoragem que
permitirão a conexão, de forma ágil, a monitores e teclados convencionais para
melhor utilização quando em escritório.
O que pode adiantar sobre o desenvolvimento do software E-Pol
para a implementação do inquérito eletrônico, em elaboração com professores da
Universidade Federal de Campina Grande (PB)?
O projeto E-Pol encontra-se na fase de implantação da versão
Alpha do sistema, ou seja, a versão inicial com todas as funcionalidades necessárias
a realização das investigações da Polícia Federal já está sendo testada na
Delegacia de Policia Federal em Campina Grande. A previsão inicial para a
implementação nacional é no decorrer de 2015, finalizando o treinamento e
ajustes até o final desse ano.
O sistema E-POL (Polícia Federal) estará
interligado aos sistemas P-JE (Poder Judiciário) e o Único (Ministério Público
Federal), cujo objetivo é possibilitar que todo o procedimento de apuração
criminal nacional possa ser controlado e auditado em todo o território
nacional. As vantagens da implantação do sistema vão desde uma uniformização e
unificação de todos os dados, como também da aplicação de um sistema de BI –
Business Intelligence, que auxiliará na analise e cruzamento de dados de todas
as investigações da Policia Federal.
O sistema será capaz de pesquisar e
verificar no momento de inserção de dados se existem informações pré-existentes
de investigações já em curso no território nacional que envolvam os mesmos
autores e o modus operandi das quadrilhas, informação compartimentada e
restrita aos policiais que participam dessas investigações, resguardado o
sigilo dos demais dados.
Há notícias divulgadas de que a PF
atualmente comanda cerca de 100 mil inquéritos no País, sobre variados crimes.
Há pessoal suficiente para tanto?
Existem hoje em andamento no território
nacional 146.035 (cento e quarenta e seis mil e trinta e cinco) investigações
para um efetivo de mais de 14 mil policiais e administrativos. A constante
abertura de concursos públicos nos últimos anos que será ampliada em razão da
obtenção, pela Polícia Federal, da autonomia na abertura de novos certames,
deverá tornar ainda mais eficiente a condução das investigações criminais pelas
autoridades policiais pelo aumento do efetivo.
Quantas são atualmente as investigações
em andamento de combate à corrupção no País?
Temos aproximadamente 200 investigações
especiais em andamento, grande parte delas no combate à corrupção. A corrupção
é mais que desvio de verbas públicas. Nessas investigações somam-se as
referentes a sonegação fiscal, crimes previdenciários, financeiros e de lavagem
de ativos.
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